Os Domingos


Os domingos são um pôr-do-sol antecipado 

 


 Todos os domingos têm um sabor a pôr-do-sol antecipado. O mesmo acontece quando há um feriado no meio da semana. Há um travo crepuscular, uma luz amarela que brota do calendário, o prenúncio de um dia de trabalho. O cheiro  entranha-se e vem com marés de lavoro, traz na brancura da espuma um roubar de horas, vergando-nos a uma imposição futura. Nada é saboreado em pleno, porque existe uma exigência que se aproxima. Passamos a ser animais amestrados envoltos em coresvelhas, desbotadas e saudosas. São ecos de poemas, memórias do que já se sentiu, que fazem brandir os pensamentos. Deambular é um domingo em pensamento amorfo. É oco, não tem calor, é frio, e a alma não se aquece com roupa. 

Como é bom ser sábado. Sábado é a flor da semana, cabeça leve despegada do corpo, o desprender da dureza das obrigações que se confinam ao intervalo entre uma cadeira e um computador. Contemplar o mar sem pensar numa estrofe semanal.  O mar ao sábado não acaba na linha do horizonte, perpetua-se, dá a volta ao globo e ainda nos toca nos ombros no regresso. Sábado é um dia redondo, rebola sem parar nas madrugadas de domingo, não há atrito de arestas. Continua a rodar. Faz tricot com as horas de domingo e alarga. 

Os domingos vértices, arrastam-se sem qualquer harmonia, aos soluços, cavalga as horas e fala-nos com usura. Nas férias redime-se e fica afogado nas semanas intensas das vontades sem arbítrio. Fica silenciado pela avalanche de dias de semana que trocam de lugar de forma desordeira e quando der conta está na fila a seguir à sexta. Todo muito bem arranjado, sentado numa cadeira de prosa, sem relógio no pulso, sem segunda à vista e sem sombras de eco.

Até lá, deixo-o impor-se desta maneira agiota, a especular sobre os meus valores emocionais, a criar-me insónias diurnas. Quando menos esperar empurro-o no degrau de sexta e troco-lhe o fim-de-semana!

 


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